sexta-feira, 19 de junho de 2009

Encontro com os Beatles

O leitor deste blog deve estar se sentindo nos anos 60. Desde aquela década que não há uma overdose de Beatles como tem acontecido aqui nesta semana. Tudo bem que uma overdose de Beatles não é uma overdose qualquer. Mas graças a mim é a última entrevista com eles nesta semana, porém a mais especial. É a primeira vez que eles se reunirão desde aquele show no teto da gravadora no século passado.

Como era esperado, o trabalho de logística para reunir tanta gente importante foi imenso. Vôos fretados da Inglaterra para o Brasil e do Brasil para a Inglaterra não foram raros! E a parte do céu que cuida da burocracia de casos de ressurreição temporária há dois mil anos não tinha tanto trabalho.

Nada melhor do que o Preto and Branco Park para se sentirem todos à vontade. Os donos do local fecharam o Park para todos nós e capricharam no efeito de luz ultravioleta que retira as cores do ambiente. Como vocês podem ver nas fotos que vêm daqui a pouco, parece que estamos realmente em tons de cinza, como antigamente.

Marcamos para o horário da tarde, que seria melhor para todos e principalmente para mim, porque não gosto de acordar cedo nem de dormir à tarde.

Contrariando as expectativas de que quem é vivo sempre aparece, justamente George e John foram os primeiros a chegar.

- Quem te viu, quem te vê, hein rapaz? - se apressou em dizer George.

- Pois é! - disse John.

Os dois se olhavam esquisito e se estranhavam. Sem dar conta de minha presença, conversaram por minutos a fio sobre os segredos do submundo. George falou da saudade de fazer cocô, e John lamentou a saudade de Coca-Cola. Ou será que foi o contrário? O assunto terminou quando John comentou sobre um desodorante do submundo. George percebeu que era com ele e trocou logo de assunto.

De novo, como George Harrison fede. É absolutamente incrível o fedor deste defunto.

Paul e Ringo chegaram mais tarde. Ringo cumprimentou a todos, sempre muito sorridente. Paul fez que não viu o John, mas John fez questão de cumprimentá-lo. Eles ficaram cerca de três minutos balançando as mãos dadas, se encarando esquisito, até que ao final sorriram, sorriram e sorriram.

Enfim, o clima parecia perfeito para uma entrevista. Para não repetir o erro de ontem, quando interagi com Paul mas não registrei tudo devidamente, tomei logo o cuidado de tirarmos uma foto com antecedência. (A foto com ele é, infelizmente, uma montagem)

Não houve briga para quem quisesse ficar no centro. O desentendimento aconteceu para discutir quem ficaria ao meu lado da foto. George argumentou que sempre foi o mais injustiçado da banda, então deveria ficar ao meu lado direito. Ringo disse que se George ficaria ao meu lado direito, ele certamente era merecedor do meu lado esquerdo. Paul se antecipou em dizer que era meu Beatle preferido, então deveria ao menos sair na foto.

John só ficou olhando.

Para sair todo mundo, colocarmos a máquina no automático, mas não deu muito certo.


Então sobrou para John, o único sem argumento, para tirar a fotografia. Ficou ótima.


- Pronto – eu disse – agora podemos ir embora.

Os quatro me olharam com bastante espanto. Pareciam estar gostando daquele momento, e eu queria encerrar tão logo?

- Vocês podem ficar aí. Eu só queria a foto.

Fui embora muito contente. Afinal, não é todo mundo que tem uma foto com os Beatles tirada pelo John Lennon.

Entrevista com Sãr Paul Mccartney

Hoje é dia de Paul Mccartney. E quase que ela não sai.

Leitor de blog é muito ingênuo. Se ele doasse milhares de reais ao invés de postar milhões de comentários, os posts sairiam com frequência muito maior! Ao invés de entrevistar os Beatles uma vez por ano, poderia entrevistá-los uma vez por semana, se o doador assim quisesse.

- E os Rolling Stones? Eu prefiro os Rolling Stones, ao invés dos Beatles.

Os Rolling Stones, também. Embora isso não tenha nenhum impacto, porque hoje qualquer um entrevista o Mick Jagger e aquele bêbado cujo nome é Keith Richards, a entrevista poderia acontecer. A partir do momento em que entra capital, eu não preciso mais fazer somente coisas de que eu goste. Mas esta é uma entrevista com Paul Mccartney, o sãr.

Posso confessar que esta é a primeira vez que fico nervoso antes de uma entrevista. Nem quando entrevistei Ayrton Senna depois de morto fiquei tão nervoso assim. Talvez seja porque eu tenha compaixão com pessoas de cabeça grande. E talvez seja também porque o Senna é um tédio. Mas você, leitor, deve notar que a surpresa maior não é meu nervosismo diante de Paul; o que estranha é eu admitir que fiquei nervoso.

Passo horas e dias tentando mostrar-me superior diante de tudo, e agora quase ponho tudo a perder. Isso é estranho?

Analisando o fato sem o seu contexto, sim. Aliás, se alguém leu este texto até o parágrafo anterior, pensará para sempre que a empáfia era de mentirinha. Mas diante de alguém que tem todos os motivos para a soberba - sucesso gigantesco, sendo que ele é justamente proporcional ao talento - e é extremamente carismático e simpático, minha altivez cai por terra!

Então, se você não conhece pessoalmente Paul, saiba que ele é, antes de tudo, um simpático. Chega até a ser bobo, de tão agradável e aprazível. Como se as bilhões de pessoas que gostam dele não bastassem, ele faz de tudo para agradar o interlocutor e conquistar mais um fã. Aliás, para conquistar o fã, ele é capaz de tratar a pessoa como ídolo. Compreende?

Para se ter uma idéia, no ato de contatá-lo para a entrevista, foi ele quem falou que poderia entrevistá-lo antes mesmo de eu dizer. Cacilda. E ele ainda disse que viria à minha casa, se precisasse.

- Precisa, sim! Venha amanhã às quatro e vinte da tarde, por favor! Abraço, outro. Tchau!

Paul apareceu muito bem vestido na hora exata. O rosto dele é realmente muito simpático. Este moço está sempre rindo!

- André! Trouxe-lhe vinhos!

Contei que não gosto de vinhos.

- Mas eu trouxe Coca, também! Você gosta de Coca?

É claro que sim. Dei-lhe logo um abraço para deixar de ser bobo.

- Quer uma massagem? Quer, né? É claro que quer.

Paul me fez massagem e fiquei mais relaxado – embora ele não tenha técnica muito apurada. Enquanto apertava minhas costas, cantarolou músicas como Hey Jude, My Michelle e Ana Júlia.

- Epa! Por que todo Beatle canta Ana Júlia?

Ele parou um pouquinho a massagem, para depois dizer:

- Foi o George que me ensinou uma vez. Nunca mais me esqueci. O John também cantarola Ana Júlia?

- Não reparei.

A massagem continuou até o momento em que minhas costas começaram a arder.

- Trouxe uns bifes, para fazer à milanesa para você! Quer? – disse Paul.

É claro que eu queria. Claro que sim.

- Então deita um pouco aí, relaxa, que eu já trago tudo prontinho.

Eu estava quase cochilando, quando Paul perguntou, constrangido:

- Onde tem farinha de rosca?

Falei que era na terceira gaveta do armário, e ele bateu as mãos na testa. Parecia que este era o único lugar que ele não procurou.

Bifinho pronto, ele trouxe numa bandeja três bifes e um copo de Coca muito gelada. Me acordou de mancinho, para não atrapalhar meu cochilo.

- André? Acorda, meu chapa. Acorda, que depois o bife esfria e a Coca esquenta e perde o gás.

Acordei, comi os bifes, tomei a Coca, e ele foi embora com a missão cumprida.

Rapaz! E a entrevista?? Quando percebi, Sãr Paul Mccartney já tinha dobrado a esquina.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Entrevista com George Harrison


No dia de hoje acordei com a imensa alegria de um dia de folga. "Ufa!", pensei, "Ainda bem que hoje não terei que entrevistar nenhum Beatle!". Espreguicei-me com todas as forças, tomei meu achocolatado com calma, e li, tim tim por tim tim, todas as notícias do Palmeiras, o time de meu coração. A campainha tocou.

Imóvel, comecei a maldizer o mundo. "Por que alguém vem me procurar num dia de folga?!", pensei. "Por quê, meu Deus? Por quê?"! O sujeito tocou novamente, mas dessa vez disse:

- André, eu sei que você está aí tomando seu café da manhã!

Era uma voz conhecida. Uma voz que já tinha atingido meus ouvidos em alguns discos dos anos 60. Uma voz inglesa, uma voz defunta! Cacilda, era George Harrison vindo me visitar!

Não havia outra coisa a fazer, senão abrir a porta. Havia me esquecido que hoje era dia de entrevistar o Harrison. Já não gosto de entrevistar pessoas importantes. Entrevistar defuntos importantes é coisa pior ainda! Se eu não fizer alguma pergunta importante, sei que milhões de beatlemaníacos reclamarão. Se eu for um pouco rude, outros também farão comentários mal humorados neste espaço.

- Olá, André!

- Olá, George! Desculpe. Acho que esqueci a geladeira aberta. E deve ter alguma panela de feijão aberta há mais de sete dias. Meu Deus, que cheiro horrível!

O cheiro era de George.

Depois de alguns anos apodrecendo em um caixão, algumas pessoas vão adquirindo um cheiro não muito agradável. Desculpe a insistência, mas lembra muito feijão esquecido na geladeira.

Parece que ele não estava com muita vontade de dar entrevistas:

- Como é que é? Não se respeita mais os mortos? Além de lidar com vermes, agora temos que nos relacionar com repórteres?

- Eu não o obriguei a dar entrevista. Aliás, nem tinha muita vontade de entrevistá-lo. Estou ansioso é para entrevistar Paul. Ele é muito cabeçudo.

- Se não foi você, então quem foi?

- Deve ter sido Deus. Dizem que ele ficou com muita vontade de ver como você se sairia depois de ver a do John Lennon. Ele adorou a do John!

- Hum... Compreendo.

Ele olhou a minha geladeira e deu outro sorriso. Foi até ela e a abriu prontamente.

- Coca-Cola! Eu quero, eu quero!

- Pode pegar.

Ele tomou os dois litros direto da garrafa, numa golada única. Antes que fosse possível arrotar, olhou-me pedindo outra.

- Só tem quente.

- Pode ser, pode ser!

Fui buscar na área de serviços e, pombas, não tinha!

- George, não tem!

Ele me olhou bravo, raivoso, puto como um super star que não teve seu desejo atendido.

- Mas eu posso lhe fazer uma limonada suíça divina! Quer?

- Não! Eu quero Coca! Não quero suco. Coca! É Coca que eu quero.

- Coca não tem. E você ainda tem que dar a entrevista.

O tédio era evidente. Não se sabe como o encontro de uma pessoa tão genial como eu com uma pessoa tão famosa e criativa como George poderia cair nesse tédio todo. Ele começou a cantarolar Ana Julia.

- O que é aquele martelo com aquele prego ali?

- Sei lá. Deixei ali sem querer.

Enquanto eu estava sentado, ele não teve dúvida. Martelou os pregos na minha cabeça.

Com uma imensa dor de cabeça, levantei bruscamente, e ele quase furou meu olho com um dos pregos!

- Vamos logo à entrevista, que você está me irritando!

- Ok, ok.

Eu: Como é morrer depois de ter feito tanto sucesso?

George Harrison: Morrer não tem segredo. É como dormir, só que pra sempre. Aliás, é como dormir com mosquitos pela noite inteira. Só que no lugar dos mosquitos, tem vermes.

Eu: Se você pudesse escolher entre morrer e estar vivo, o que preferiria?

George Harrison: Estar vivo, com certeza. Na vida, tem Coca-Cola. Aliás, está me dando uma vontade absurda de fazer cocô.

George correu para o banheiro sem que eu lhe dissesse onde ficava. Engraçado, que a necessidade fecal nos porta de uma bússola instintiva - em que o norte é o banheiro. Fiquei ao lado da porta, primeiro para saber como é que um Beatle defecava. Depois, para saber como um morto fazia cocô!

Posso dizer que o cheiro é o mesmo. Se não o mesmo, um pouco mais adocicado. A cada pum que ele soltava, o cheiro melhorava. Parece que os mortos realmente tôm dentro a melhor parte.

Ele não deu descarga e saiu sem lavar as mãos, o que me pegou inteiramente de surpresa. Fiquei um pouco preocupado ao pensar se ele usou ou não papel higiênico.

Sei que isso não pode ser de seu interesse. Sei que o que um Beatle pensa é importante porque isso só ocorre com um beatle, e que cocô dele não é importante porque todo mundo faz. Se não quiser saber mais sobre o tema, faça o favor de pular algumas linhas.

Acontece que olhei a privada algumas horas depois e não havia nada lá, a não ser uma marca de cocô no fundo da privada, que pode ter sido provocada por qualquer outra pessoa. Eu não a fiz, porque isso nunca me aconteceu, mas eu não moro sozinho, e não posso responder pelas outras pessoas da minha casa.

Eu: Como é fazer cocô depois de tantos anos?

George Harrison: É tão bom quanto tomar Coca depois de tantos anos, como arrotar, soltar pum e suar depois de tantos anos. Me diga com sinceridade. Eu estou fedendo?

Eu: Está, sim.

George Harrison: Era exatamente o que eu desconfiava. Você se importaria se eu fosse embora agora?

Eu: Nem um pouco. Sexta-feira a gente se vê no encontro com os outros Beatles.

George Harrison: Ok. Até lá!

terça-feira, 16 de junho de 2009

Entrevista com Ringo Starr


Foi difícil acordar cedo nesta terça-feira para entrevistar o grande baterista Ringo Starr. Não que ele não seja um grande sujeito. Muito menos que não tenha um papo agradável. Acontece que fui dormir tarde ontem, e quando marcamos nosso encontro, o inglês foi bem claro:

- Encontre-me às oito. Ouviu? Oito. Eu não disse sete, nem nove. Eu disse oito. Espero que tenha ouvido corretamente.

Ele não precisava ter sido tão enfático para que eu chegasse no horário. Para quem não sabe, sou uma pessoa muito pontual. Há quem pense que a pontualidade é uma grande demonstração de respeito. E até é, um pouco. Mas, para mim, pontualidade significa a hora mínima para que o encontro termine o mais rápido possível. Assim. Se eu chegasse à entrevista com o Ringo às oito e quinze, por exemplo, eu me livraria dele quinze minutos mais tarde. Então fui pontual para que a entrevista terminasse mais cedo do que se não o fosse.

Cheguei à casa dele às sete e cinquenta e oito, porque pontualidade exige planejamento e antecedência. É impossível ser sempre pontual se baseando no horário da chegada. É preciso ter sempre como meta chegar ao local desejado uns quinze, vinte minutos antes. Porque possivelmente haverá alguma coisa que o atrase quinze, vinte minutos. Isso falha quando há um grande problema que o atrase por muito tempo. Aí não há remédio possível.

Dim, dom.

- Who is it?

- Em português, please.

- Quem é?

- Sou eu, Ringo. O André, do blog Eu não sou virgem, Maria!.

- Ó! Pode entrar, rapaz. Vem entrando, por favor!

Ringo abriu-me o portão, e fui caminhando pelo longo jardim de sua residência muito rica. Depois de passar por sete árvores, dezessete bromélias, quatro poodles, seis pastores alemães, sete empregados, quatro faxineiras e dois urubus, encontro com o sorridente Beatle segurando a porta aberta para mim.

- Olá, grande amigo! - me diz ele.

- Olá, meu chapa! Olá!

Cumprimentamos-nos efusivamente. O abraço demorou mais do que seria agradável, e a barba dele arranhou minha bochecha. Vi que uma garrafa de dois litros de Coca-Cola me esperava, gelada.

- Ringo. Com grande pesar, sou obrigado a recusar esta Coca-Cola. Não suporto refrigerante antes do meio-dia.

Ele levantou os ombros, como se não se importasse.

- Vamos às perguntas?

- Sim, sim. - disse Ringo em sua humildade avassaladora.

Outro dia alguém me perguntou o que seria dos Beatles, se Ringo e George Harrison também fossem gênios. Eu não respondi nada, mas se me refizessem a pergunta no dia de hoje, eu diria que os Beatles seriam um grande fracasso. Numa grande banda, é preciso que a genialidade seja bem centralizada, e haja gente que faça coisas bem simples, para não atrapalhar. Ringo e George não atrapalham divinamente.

Eu: Tudo bem, amigo?

Ringo Starr: Tudo.

Eu: De onde vem seu apelido?

Ringo Starr: Não sei se você sabe, mas meu nome é Richard. Mas sempre usei muitos anéis. Então me apelidaram Ringo, porque em inglês, anel é ring.

Eu: Entendo. Tem alguma coisa que você gostaria de dizer?

Ringo Starr: Acho que não.

Eu: O que é isso ali em cima?

Ringo Starr: Um grammy. Quer?

Eu: Você está falando sério?

Ringo Starr: Claro, pode pegar. É teu.

Eu: Então podemos encerrar a entrevista. O que você acha?

Ringo Starr: Eu simplesmente adoraria.

Foi assim que a entrevista de hoje terminou. Ringo ficou aliviado por não ter que falar muito, e eu fiquei descansado por não precisar entrevistar muito. Terça-feira é para profissionais.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Entrevista com John Lennon


John Lennon recebeu me de braços abertos: ele espreguiçava. Finalmente, depois de tantos anos, ele podia andar tranquilamente pelas ruas de Liverpool. Muitas pessoas olhavam esquisito ao nosso rock star, mas tinham a certeza de que era um sósia. Um sósia perfeito, mas um sósia. Se eu fosse um pouco maldoso, diria que ele sentia um pouco de falta do reconhecimento do público, mas talvez isto não seja preciso. Aquilo denotava mais estranhamento do que falta.

- Como vai, meu amigo John? - pergunto por trás.

Ele se assustou gravemente e me olhou assustado por uns dois, três segundos. É difícil de se habituar com a vida na Terra. Depois desses segundos, deu-me um abraço ainda sem denotar nenhuma expressão. Demos tapas fortes nas costas, e ele me disse o seguinte:

- Rapaz, lendo seu blog, eu pensei que você não existisse!

Ao que eu respondo:

- E eu, que pensei que você estivesse morto?

John:

- Morto eu estou, mas não é por isso que vou deixar de viver. A vida parece ser o contrário da morte, mas não é. Vida é uma coisa, morte é outra. Viu esse filme do Godard?

É claro que não vamos falar de cinema. Quanto mais de Godard. Se eu quisesse falar de Godard, entrevistaria o próprio. Tanta coisa para falar com o defunto, e vou desperdiçar o tempo falando sobre um cineasta francês?! John interrompeu este meu pensamento:

- Veja só como são as coisas. Faz mais de vinte anos que não vejo minha esposa Yoko, e faz cinco minutos que não fico pelado. E não é que a saudade que eu sinto por estas coisas é a mesma?

- Então você quer ficar pelado?

- Quero, sim. De preferência, com a Yoko.

Fomos a pé até a casa onde Yoko mora. John se mostrava incrivelmente desconfortável com aquelas roupas. Tudo bem que quando a gente morre, não veste mais nada. Mas tem tanta coisa para se preocupar com a vida na Terra, e o que lhe afligia eram as roupas.

Tocamos a campainha.

- Quem é? - diz Yoko, olhando pelo olho mágico horizontal, especialmente planejado para pessoas orientais.

- Sou eu, meu amor! - John.

Ouve-se baixinho, porque a porta abafa:

- Puta que pariu. Mais um sósia.

E ela abre a porta, com disposição somente para tirar uma fotografia.

John vai até ela, a abraça, e parece que Yoko se sentiu realmente comovida, mas nunca convencida. John fechou a porta com força e foi logo tirando a roupa.

Você tinha que ver a reação de Yoko. Ela abriu a boca estupefata. Um jornalista diria que ficou impressionada pelo tamanho do pênis de John, que é realmente grande. Mas o que a impressionou foi a incrível semelhança com o original.

- É igualzinho! Idêntico! Os sósias estão ficando cada vez mais parecidos.

Pensando depois nesta história toda, o que me vem à cabeça é a dúvida: Por que John não disse que era de fato ele mesmo? Por que ele não disse: "Sou eu, meu amor! Sou eu!"?

Vamos à entrevista, que eu acho que é o que interessa.

Note que John respondeu a todas as perguntas sem uma vestimenta sequer, e isso me causou um certo constrangimento em algumas perguntas.

Eu: John, conte um pouco de sua vida extra-terrestre.

John Lennon: A vida extra-terrestre é muito boa. Eu, se fosse um governante atual, investiria uma quantia considerável na busca de povos de outros planetas. Há muita coisa gostosa fora daqui. Há de se considerar que sou um privilegiado. Todas as portas me estão abertas. Eu posso entrar no céu de Jesus, porque tive muitos fãs católicos que rezaram por mim. Tenho também passe livre no Paraíso de Alá - parece que os shakes adoravam minhas canções. Então é aquela coisa, eu te dou a visão positiva da vida extra-terrestre, que, para mim, é inegavelmente boa.

Eu: Melhor que a terrestre?

John Lennon: Não sei se melhor ou pior. É diferente. Tem várias coisas que têm na Terra e não têm lá, e que fazem falta. Por exemplo, lá a gente não faz cocô. Me diga você: Tem alguma coisa melhor do que fazer cocô? Eu tenho as setenta e duas virgens, conheço os anjos, essa coisa toda. Mas às vezes dá vontade de fazer cocô e ele não vem, porque não tem cocô fora da Terra.

Eu: Do que mais você sente falta daqui da Terra?

John Lennon: Coca-Cola, chocolate, show lotado, futebol, andar de avião, fazer sexo pelado, ser reconhecido por milhões de fãs, ver TV, comer cachorro quente, piada de mau gosto...

Eu: Entendo. Por que você não dá entrevista desde o ano de 1980?

John Lennon: Não dou entrevista porque ninguém me procurou. Todo mundo lamenta, quer saber qual seria a minha opinião sobre algumas coisas. E é só pedir! Como você fez. Pedir para Deus, que ele é o único que pode me liberar. As coisas são muito injustas. Eu vivi quarenta anos e vou existir por toda a eternidade. Mas só o que eu fiz e falei nesses quarenta anos é que as pessoas vão saber. O resto, parece que não existe!

Eu: Vamos falar um pouco de música. Você tem composto ultimamente?

John Lennon: Tenho, sim. Antes de vir para cá, por exemplo, tentei gravar o hino do seu blog. Mas as rimas são muito difíceis e me foi impossível. Você tem certeza de que a pessoa que o compôs pensou na musicalidade da coisa?

Eu: Não pensei, não. E eu não pedi para você gravar. Está certo que seria incrível se você gravasse. Mas não gravou. Fora isso, não tem composto mais nada?

John Lennon: Tenho, sim. Mas lá não tem violão e gravador. Então fica aquela coisa na cabeça. Tudo o que eu componho dura o tempo da memória. Ou o tempo da inspiração. São coisas muito curtas.

Eu: Diga um livro que mudou a sua vida.

John Lennon: O apanhador no campo de centeio.

Eu: Um homem que mudou a sua vida.

John Lennon: Mark David Shapman.

John olhou para o relógio e percebeu que só tinha mais cinco minutos aqui na Terra.

- Tenho que ir, meu chapa.

Posamos para a foto. Acho que ficou para a história.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Aviso importante sobre a entrevista com os Beatles

O leitor deve ter reparado que nesta semana este blog não foi atualizado sequer uma vez. E à exceção deste post, não será atualizado nenhuma outra.

- É por preguiça, seu preguiçoso?

Poderia até ser, e eu acho que seria um motivo digno. Mas desta vez, não. Nesta semana o blog não será mais atualizado porque este criador está preparando, para a semana que vem, uma série de entrevista com a maior banda de rock de todos os tempos: Os Beatles.

Começaremos na segunda-feira, com John Lennon. Ele foi morto em 1980, mas isto não foi obstáculo para uma entrevista em Londres. Deus, um colaborador convicto deste espaço, disse que conseguiu convencer o astro inglês a falar com exclusividade a este blog depois de muito esforço. Mas como não sou bobo, percebi que foi John quem teve que convencer Deus. Ele será o primeiro entrevistado para que se quebre logo com esta expectativa, e o leitor possa prestar atenção integral aos outros entrevistados.

No dia seguinte, terça-feira, Ringo Starr conversará comigo também em Londres. Escolhi terça-feira que é um dia qualquer e, francamente, ninguém tem muita vontade de ler uma entrevista com o Ringo. Se eu fosse um simples leitor, leria correndo, sem muito apreço.

Quarta-feira, outro defunto: George Harrison. Deus não queria deixá-lo falar comigo. Ele teve que convencer Deus sob o argumento de que se John pôde falar, por que ele não poderia? Deus coçou a cabeça e foi obrigado a concordar, resignado. Esta seria uma entrevista como a do Ringo. Mas George é um defunto, e sempre que um defunto fala, um vivo presta atenção.

Quinta-feira falo com Paul McCartney, o mais cabeçudo dos quatro. Ele preferiu que nosso encontro fosse na Escócia, em um pub esquisito.

A grande entrevista, porém, será na sexta-feira. Este será o dia em que, depois de quarenta anos, os Beatles se reunirão novamente. Acho que eles não cantarão nenhuma música, embora tenham pedido que a produção do blog lhes reserve uma bateria, um baixo, duas guitarras e microfones à vontade.

O leitor deve pensar que estou muito nervoso pelas entrevistas da semana que vem. Eu até estaria, se gostasse tanto desta banda quanto ela gosta de mim. Mas não. Nervoso eu ficaria se fosse entrevistar o Valdívia, ou o Edmundo. Ou se pudesse ver meu finado cão Cafu mais uma vez.

Mas são só os Beatles.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 5º round

- Voltamos com o quinto round deste grande espetáculo. Deu, o singular de Deus enfrentou até aqui Deus, o plural de Deu. Mas é com pesar que informo à minha distinta platéia que Deu abandonou o recinto, alegando ter ganho o debate por barbada!

Deus interrompeu:

- Mas agora eu é que ganhei de WO.

- Bem, - respondi - isto não estava previsto no regulamento. Mas quando o Senhor disse que torce para a seleção brasileira, quase abandonei o recinto.

Deus ficou avermelhado.

- Mas não se importe. Neste bloco, há uma grande chance de redenção. Vamos lhe fazer perguntas que vêm de todos os lugares. Do Oceano Pacífico ao Oceano Atlântico, do Oceano Pacífico ao Guarujá, a pérola do Atlântico! Vamos à primeira. Ela vem de Cascavel, Paraná. Deus, até quando a menstruação continuará a ser um privilégio feminino?

Deus desembaralhou seu calhamaço de papéis com atenção e a resposta não foi outra, senão essa:

- Muitas mulheres reclamam da menstruação. Eu também não gostaria de menstruar. Uma vez testei a menstruação em mim mesmo, e tive que fazer a Guerra dos 100 anos para prover tanto sangue que saía de minhas genitais. Não deu certo. O órgão genital feminino favorece deveras a circulação de sangue. E o cheiro atrai os homens. Se as mulheres não menstruassem, creio que a homossexualidade aumentaria profundamente no mundo. Nada contra os homossexuais como eu e Deu já frisamos aqui. Acontece que as mulheres também merecem fazer sexo com um pênis. Então é uma escolha. Ou se menstrua e faz sexo com pênis, ou não se menstrua e se utilizem de borrachas.

A platéia não esperava tamanha franqueza de Deus. É a primeira vez na história que se ouve um líder religioso citando, mesmo que indiretamente, vibradores e variantes de pênis de borracha. Esta era a pergunta seguinte:

- Essa é de Pirinópolis, o estado me foge agora. Porque o senhor da guerra não gosta de crianças?

- Ah, muito obrigado, habitante de Pirinópolis. Rapaz, eu também não sei onde fica essa cidade. Desde que um grande autor de auto-ajuda escreveu uma música dizendo que o senhor da guerra não gosta de crianças, tenho recebido muitos e-mails questionando este fato. Acontece que tive muito trabalho para fazer com que o senhor da guerra não gostasse de crianças. Imagine! Ele já faz guerra, se gostasse de crianças, seria um pedófilo bélico! Cruzes!

Trovão.

- A pergunta seguinte vem de Piraporinha do Norte, cujo estado não quis ser citado. Se o senhor está em todos os lugares ao mesmo tempo, então quer dizer que há a possibilidade de estar encostando na gente enquanto urina?

- A pergunta desta pessoa é muito boa. Mas a resposta é curta: Eu não estou em todos os lugares ao mesmo tempo. O que há são meus representantes que adquiriram a franquia divina em todos os lugares do mundo.

- Esta pergunta vem de Guarujá, São Paulo. O Senhor realmente torce para a seleção brasileira?

- Torço, sim, por quê? - respondeu Deus, enfezadinho. - É a terceira vez que meu gosto futebolístico é aqui questionado. Torço para a seleção brasileira porque, como todos sabem, Deus é brasileiro.

Entendo.

- Deus, agora me diga. Qual é o melhor blog do mundo?

- O melhor blog do mundo é o Eu não sou virgem, Maria! E posso anunciar que ele será o blog oficial da Copa do Mundo de 2014!

- Muito obrigado, muito obrigado. Bem, senhores, vejo que nuvens se aproximam. É dada a hora de irmos embora. Espero que este debate tenha sido elucidador! Tenham todos uma boa noite.

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 4º intervalo

Chegamos ao último intervalo do grande duelo, e nele tivemos uma grande surpresa. Deu, o singular de Deus, apertou o cinto e informou que ia embora.

- Para nunca mais voltar! - frisou.

Ele argumentou que estava muito cansado, e que já havia ganho o debate quando Deus disse que torce para a seleção brasileira.

- Quem torce para a seleção brasileira ou é afeminado ou mentiroso. Nada contra os afeminados. É que Deus é mentiroso mesmo. E nada contra Deus, mas ele é mentiroso, sim. Fora isso, tenho que encontrar um peixe fora d´água que está a me esperar lá em casa.

Foi uma boa razão. Pena que o debate se transformou em um monólogo. Tudo bem, um monólogo com um cara tão plural é quase uma reunião!

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 4º round

- Estamos chegando ao quarto e penúltimo bloco de uma conversa sem precedentes na história da humanidade. De um lado, o grande fanfarrão Deu, com seu um metro e sessenta mal distribuídos. Do outro, Deus, com seus bilhões de quilômetros divinamente arredondados. Para quem não sabia e está ligou a televisão agora, Deus é gordo!

Neste instante, Deus pede a palavra:

- Por favor, André. Por favor. Eu gostaria de fazer um anúncio!

- Opa! Vai entrar para a Bíblia?

- Creio que sim. A correção bibliográfica sai no ano que vem, num acordo entre todos os povos. Mas não é este o anúncio. Eu quero dizer que um dos pecados capitais não mais existirá.

- Oba! - eu disse - Agora já posso sentir inveja sem culpa?!

- Não! Inveja é feio, inveja é crime, inveja é foda. Você pode continuar sentindo inveja, só não pode senti-la sem culpa. Quero anunciar que a gula não é mais um pecado capital! Podem comer à vontade. Inventei este pecado porque faltava comida. Hoje não falta mais. Hoje não pode é jogar comida fora. Mesmo que para isso seja preciso ser guloso!

- Então agora são seis pecados capitais? - perguntou Deu, que já se sentia um pouco excluído do debate.

- Não, não! Continuam sete. Como a gula era o primeiro, são sete, começando do segundo, mas o primeiro fica vago. Preciso pensar em outro. - disse Deus extremamente sereno.

- Eu tenho uma sugestão para o primeiro pecado capital. - gritou Deu, com seu microfone falhando - Para mim, o novo pecado capital deve ser a extroversão! Viva os tímidos!

- Taí uma boa idéia, disse Deus coçando a barba. Pode ser esse, Deu? Mas você não vai querer cobrar os direitos autorais, né?

- Conversaremos depois sobre isso. - falou Deu, agora com o microfone restabelecido.

Os dois estavam saidinhos demais. Era preciso continuar com o roteiro do programa. Desse jeito, eles se reuniriam. Um seria líder, o outro suplente, e a humanidade seria entregue a um monopólio. Chamei meu primeiro convidado da noite.

- Liguem os holofotes, porque aí vem Roberto Justus!

Deus fez cara de espanto, enquanto Deu não escondeu o nojo.

- O que é isso? Vocês não querem o Roberto Justus?

Ambos fizeram que não com a cabeça.

- Então pode ir embora, Roberto! - eu disse com meu melhor sorriso. - É preciso começarmos as perguntas de teste de empresas, porque muitos psicólogos e empresários estão assistindo a este duelo, e não saberiam decidir sem estas perguntas. Vamos começar. Deu, qual foi o último livro que você leu?

- A Bíblia, para estudar meu adversário.

Deus:

- Eu li "Quem mexeu no meu queijo?", porque estavam invadindo a fábricas de queijo na Suíça. Mas não ajudou muito, não.

- Se você pudesse mudar uma coisa no mundo, qual seria? Deus.

- Eu posso mudar o que eu quiser no mundo.

- E você, Deu?

- Eu acabaria com a enxaqueca.

- Quais são os seus times? Deu.

- Eu torço para o Palmeiras. Mas apesar de gostar de comida italiana, não gosto do Flamengo e do Corinthians, time das massas.

- Deus?

- Eu torço para a Seleção Brasileira!

- Vejam esta foto:


- O que está faltando nela? Deus.

- Estou faltando eu.

- Deu?

- Faltam mulatas.

O bloco já podia ser encerrado.

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 3º intervalo

O terceiro intervalo deste caloroso debate foi marcado por uma situação muito curiosa.

Enquanto Deus conversava com seus anjos, Deu debatia calorosamente com um desafeto da plateia. A gritaria foi tanta, que Deus chegou perto para saber o que estava acontecendo. Deu explicou-lhe a situação, que não importa aqui contar qual era, e Deus concordou com o ponto de vista de Deu.

Resultado: Deu e Deus se uniram contra o desafeto da plateia, e no final, quando estávamos prestes a começar o quarto bloco se cumprimentaram efusivamente.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 3º round

Assim introduzi o terceiro round deste grande duelo:

- Estamos de volta com o terceiro round do duelo, da briga, do debate, da disputa, da querela, da rixa entre Deu, o singular de Deus e Deus, o plural de Deu! Vamos conferir a pulsação dos dois candidatos! Primeiro Deu!

Olhamos todos para Deu, enquanto os paramédicos instalam o medidor em seu pulso.

- Oitenta e seis batimentos por segundo! - grito, exaltando o coração deste grande homem. - E agora, Deus! - todos olhamos para Deus, e os paramédicos têm uma postura corporal esquisita. Talvez seja pelo resultado - Cinco trilhões, novecentos e sessenta e seis mil, trezentos e quarenta e quatro batimentos por minuto! Isto significa nervosismo, Deus?

- Não, não. Meu coração costuma bater para mais de seis, sete trilhões, em épocas de guerras mundiais. Agora estou calminho. Meu coração tem que bater forte assim porque, como pode ver, sou muito grande. Dá muito trabalho estar em todos os lugares.

- Compreendo, compreendo! Isto também demanda muito sangue, como posso imaginar! E você, Deu? Está nervoso para o terceiro round?

- Como poderia estar nervoso num debate em que estou vencendo? - respondeu Deu, sempre bonachão - Meu coração está ótimo, porque, ao contrário do que dizem, a gordura trans faz muito bem ao corpo humano! E minhas veias esbanjam gordura trans, graças a Deu, graças a mim.

- Sei, seu fanfarrão! - respondi - Este bloco trata do plano de governo. Queremos saber quais são os projetos de nossos dois candidatos para os principais problemas do mundo. Os dois responderão as mesmas perguntas, para que o eleitor tenha base para comparar os dois programas de governo. Estão prontos para a primeira pergunta?

- Sim, sim! - respondem os dois.

- Então respondam, começando por Deus. Quais são seus planos para a solução dos problemas da África?

- O problema da África é tão complexo, - começou Deus - que não vejo uma solução possível. Creio que a melhor alternativa seja dar aos humanos a chance de habitar outros planetas. Assim as pessoas mais abastadas morariam em Marte, e os habitantes da África poderiam se mudar para a Europa, Estados Unidos e Austrália.

- E você, Deu? Como resolveria o problema da África?

- Eu? - disse Deu - Primeiro quero comentar a resposta de Deus. Ele sempre fala que acabará com a fome do mundo, mas que nada! Todos pedem: “O pão nosso de cada dia, nos dai hoje”, mas Deus não dá ouvidos a ninguém. Eu resolveria os problemas da África matando alguns líderes capitalistas pelo mundo. Mas um aparte: Não me chamem de comunista. Só quero matar os líderes capitalistas porque eles monopolizam comida.

- Segunda pergunta! Para os senhores, a Sonia Abraão continuará com tanto espaço para falar abobrinhas? Deus, por favor.

- Já falei várias vezes com esta mulher. Se ela não parar de falar abobrinhas e de se comunicar com defuntos, ela perderá o espaço na televisão para sempre. Mas ela prefere ouvir o diabo...

- Deu?

- Quem é Sonia Abraão? – perguntou Deu.

- Aquela que você chamou de filha da puta na terça. – intrometeu-se Deus.

- Ah, sim! Sabe o que essa mulher é? Eu vou te contar o que ela é. Ela é uma filha da puta.

- Não dará a solução para a existência dela?

- Não tem solução. Não sei se vocês sabem, mas é difícil lidar com uma filha da puta. Eu participei de um debate no programa dela, e fui editado em tempo real. Isso, em tempo real. Eu também não pensei que isso fosse possível, mas aconteceu. Além do mais, ela não me pegou os vinte mil reais que cobrei pela participação no debate. Então veja como fiquei: Participei de programa em que fui editado para pior em tempo real, manchei minha reputação e não ganhei dinheiro. Assim não dá.

- Agora uma terceira pergunta para fechar o bloco! Uma para Deus, outra para Deu. A primeira é para Deus. Se Deu é por nós, quem será contra?

- Boa sacada, boa sacada. Eu quero salientar que não estou contra Deu. Se ele fosse um candidato melhor que eu, não hesitaria em entregar-lhe o monopólio religioso da humanidade. Ele é muito bom. É uma ótima pessoa, com boas idéias. Mas acontece que eu sou perfeito. Se Deu está contra mim, não há problema. Eu não estarei contra ele. Deve ter alguns fanáticos contra Deu, mas nada com o que ele deva se preocupar.

- Agora, Deu. Se Deus é por nós, quem será contra?

- Não sei. É melhor você encerrar o bloco. Não tenho paciência para lidar com esta conjuntura.

- Voltamos já.

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 2º intervalo

Nada aconteceu de relevante no intervalo entre o segundo e o terceiro round entre Deu e Deus.

Deu estava muito tranquilo, e sentou-se quase deitado, com sua imensa barriga para cima. Deus tinha postura perfeita, olhar perfeito. Quem olha para Deus, tem a exata sensação de que ele é perfeito.

Quando faltavam três minutos para o fim dos comerciais, fui ao banheiro fazer xixi. Terminei somente quando restavam alguns segundos. Haja xixi.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu – 2º round

Quando o diretor televisivo informou que cessaram os intervalos, pigarreei rapidamente para introduzir o segundo round de nosso debate.

Percebi que Deu mantinha um ar bonachão, enquanto Deus estava um pouco inseguro. Acho que Ele não esperava tamanha força de argumentação de seu oponente. Assim como não era de sua expectativa que a sexualidade de seu filho fosse posta em questão. Tentava manter um ar sereno, mas a preocupação era evidente.

- Sejam todos bem-vindos ao segundo round deste debate sem precedentes na história! – disse eu, quase gritando – Neste bloco, teremos a participação popular. Os espectadores nos enviaram cartas e vídeos com perguntas capciosas. As melhores serão exibidas aqui. Será que nossos candidatos estão prontos para enfrentar o grande público? É o que veremos a partir de agora!

Um grande telão foi posto no centro, entre Deus e Deu.

- Vamos à primeira pergunta! E ela vem de Manaus de uma fiel de Deus!

Eis o vídeo:

- Olá, Deus! Olá, Deu! Eu sou de Manaus e sempre fui fiel a Deus. Meu nome é Celeste. Creio que Deu é um cara muito novo, despreparado para tantas responsabilidades. E é sobre isso que irei falar. Sobre portabilidade. Enquanto posso acessar os serviços de Deus onde quer que eu esteja, sendo necessário somente rezar, para falar com Deus é preciso fazer uma ligação interurbana. Isto quando ele atende o celular! Deu, até quando será tão difícil falar com você?

Aplausos efusivos da platéia.

- Com a palavra, Deu!

- Olá, cara Celeste. – começou Deu, o singular de Deus - Pensei que a produção deste debate fosse selecionar as melhores perguntas. E também, por que a senhora não enviou uma carta? Assim pouparia a nós e a todos os espectadores de tamanha feiura! Mas agradeço por sua pergunta porque é uma grande oportunidade de desfazer um mito que passou por séculos. Eu disse séculos, não dias! Séculos! Quem disse que Deus escuta quando nós rezamos? Rezar é como falar com alguém que não sabemos que é surdo. Ou seja, a gente fala, acha que a pessoa escutou, e nos sentimos bem por passar a mensagem. Quando na verdade, a pessoa não ouviu bulhufas. É surda! Eu entendo a minha baixa disponibilidade. Mas pode ter certeza de que quando a senhora fala comigo, eu escuto e resolvo!

O burburinho não foi pequeno na sessão. Pratos de comida foram jogados ao ar. Até um tiro de revólver se ouviu. Aos berros, tentei conter a multidão, e não obtive sucesso.

- Deus, por favor, cale estas pessoas!

Em um segundo todos estavam mudos.

- Responda, Deus.

- Deu é mesmo muito audacioso. – respondeu Deus – E, se não está fingindo ignorância, é altamente burro. Como todos sabem, sou o Todo-Poderoso, criador do céu e da terra. Diferentemente de uma pessoa comum, quando vários conversam comigo, sou capaz de dar atenção plena a todos. Atenção plena, ouviu? E assim, resolvo todos os problemas do mundo.

- Como?! – interrompeu Deu – Resolve todos os problemas do mundo?! Então a fome na África não é um problema! A pedofilia, o nazismo, a miséria também não! Porque se fosse, o Senhor já os teria resolvido! – disse às gargalhadas.

- Quero que saibam que o que pedem às vezes não é o melhor. Tem gente que pede coisas que somente lhe causaria malefícios! Se há quem passe fome é porque precisa da fome! A fome é proposital!

- Bem, não preciso dizer mais nada. – ao dizer estas palavras, um sorriso triunfal era visível em Deu.

Estava aí um bom argumento. Deus se mostrava como o candidato mais teórico, enquanto Deu ia na prática. Nas pesquisas de Ibope em tempo real, era possível perceber um freqüente aumento da credibilidade de Deu. Vinha agora uma segunda pergunta. Desta vez, um fiel de Deu foi o escolhido.

- Olá, Deu! Como vai, Deus? Meu nome é Josevaldo, e faço agora uma pergunta a Deus. Deus, que horas são?

- Quatro e cinqüenta e oito.

Deu olhou no relógio e não tinha objeção nenhuma a fazer.

Assim encerrei o segundo round. Se isto fosse uma luta de boxe, Deu estaria vencendo por pontos.

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu - 1º intervalo

O intervalo entre o primeiro e o segundo round de nosso debate correu com um grande trauma.

Deu ficou irritado com um assessor que pegou uma paçoquinha sem sua autorização. Aliás, isto foi o que o assessor argumentou, diante da acusação de Deu de que aquilo era roubo. "Vai ser fiel de Deus! Deus é que perdoa a tudo e a todos. Eu só gosto de gente fina e gente boa. E gente fina e gente boa não rouba paçoquinha!", gritou para grande constrangimento de todos. O assessor iniciou um choro e foi logo acolhido por Deus.

Fora isso, nenhum outro problema.

Para manter a boa voz, Deus e Deu tomaram bastante água. E para ninguém interromper o debate para fazer xixi, foram os dois ao banheiro.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Deu, o singular de Deus x Deus, o plural de Deu - 1º round

Sempre houve uma grande rixa entre Deu e Deus. Sempre que Eles iniciaram uma conversa, nunca chegaram a um consenso. Deus se acha superior porque é o plural, e Deu se acha superior por ser singular. E assim baseiam seus argumentos: Um acha qualidades irrevogáveis onde o outro vê um defeito indiscutível.

É por isso que resolvi propor o primeiro debate público entre os dois. Assim as picuinhas serão postas de lado, e os fiéis saberão qual é o melhor e mais confiável líder espiritual.

O encontro foi na minha casa, para que ninguém se sentisse prejudicado. Deus ameaçou reclamar, mas no mesmo instante pedi que meus empregados lhe servissem um manjar dos deuses, seu prato preferido. Deu ficou um pouco enciumado, mas outro garçom lhe serviu paçoquinhas, seu tira gosto preferido.

Quase que o encontro que discutiria o futuro espiritual da humanidade foi subvertido a um mero colóquio culinário. Deus se distraiu e sua barba ficou logo toda manchada pelo manjar. Deu não dava ouvido a seus assessores - só achava tempo para recolher os farelos das paçoquinhas, surdo aos argumentos de que haviam muitas outras mais.

O debate ia começar, quando percebi que havia murmurinhos entre os assessores. Deus queria usar o banheiro.

- É para o número dois - cochichou-me Santo Inácio, com quem tenho muita intimidade.

Deu ouvia tudo achando muita graça, quando pousou gravemente sua mão esquerda sobre a barriga: Também teria que usar o toalete. Foram profundas as negociações, mas ficou decidido que Deus usaria o banheiro dos fundos, e Deu, o banheiro dos patrões. E de novo entramos em um impasse. Deus esbanjou sua escolha, que evocava humildade. Deu comemorou sua opção, que demonstrava superioridade e grandeza.

Se quiserem saber meu ponto de vista, acho que Deu se deu melhor. Na minha casa, não comprou papéis higiênicos de boa qualidade aos empregados. Eles não sabem lidar com a alta classe.

Poderíamos enfim começar o debate. Quarenta e cinco minutos de atraso. Comecei com a seguinte fala:

- Bom dia, Deu! Bom dia, Deus! É bom falar com os dois ao mesmo tempo. Creio que você já estão cientes de que terão que pagar os honorários de meus empregados. Vocês se atrasaram quarenta e cinco minutos nos banheiros para o início deste duelo.

- Por mim, tudo bem! - diz Deus - Eu até acho bom. Não tenho problemas com dinheiro, ao contrário de Deu. Tu preferes que eu dê tudo em gorjetas, diretamente aos funcionários, ou que te entregue o dinheiro, para que tu, então, pagues os funcionários?

- Dê-me diretamente. - Respondi - E você, Deu? Como pagará a sua parte?

- Eu não pagarei a minha parte. Isto é ladainha.

- Ponto para Deu! - disse prontamente - Um líder espiritual da altura de vocês deve saber quando alguém lhes está passando para trás. Por isso, Deu tem a primazia da palavra. Três minutos para a pergunta.

- Eu não quero me prolongar muito. Nem utilizarei os três minutos. Quero somente perguntar o seguinte a Deus. Se Jesus não é homossexual, por que ele tem cavanhaque?!

Altos burburinhos pela casa. Um trovão se ouve do lado de fora, e Deus, visivelmente vermelho, inicia sua resposta.

- Se Jesus é homossexual, jacaré é verde! Quero frisar que não há mal nenhum em ser homossexual nos tempos de hoje. O problema era quando a humanidade era baseada em alicerces inseguros, e era necessário que se aumentasse a população a qualquer custo. O número de humanos já é satisfatório. Quem quiser reproduzir, que reproduza. Mas quem não quiser, não tem problema. Um instantinho, por favor. - Deus escuta um de seus assessores, que lhe fala ao pé do ouvido - Acabo de receber a informação de que jacarés são verdes. Me desculpem pelo equívoco. Ao contrário de Deu, criei muitos animais, e isto chega a me confundir. Mas Jesus, meu filho, não é homossexual. Posso vos assegurar.

Deu inicia sua resposta em tom irônico.

- O que adianta criar tantos animais, se não sabe nem a cor deles? Eu não criei nenhum, mas meu filho não é homossexual. Jesu é macho!

Aplausos da plateia, e encerro o primeiro round deste debate para o intervalo comercial.

Telefonema de Obina

Era quase meia-noite, quando meu telefone tocou. Eu não ia atender, não estivesse escrito este nome no visor de meu celular: Artilheiro Obina. Era o craque quem me telefonava. E eu não sou daqueles que deixam craque esperando.

- Fala, Mestre Obina!

- Como você sabe que sou eu?

- Porque comprei acarajé! E você tem um faro apurado de acarajé.

- É... é... Mas eu liguei para dizer que fiz um gol!

- Ah, é para isso que me ligou? Mais nada?

- É! Fiz um gol pelo Palmeiras!

- Obina. Entenda uma coisa. As pessoas nunca te darão valor se você não tiver um mínimo de arrogância. Ninguém leva a graça a sério. Você tem que marcar os gols como se não se importasse, como se isso lhe fosse natural.

- Mas eu gosto tanto de marcar gol!

- Eu sei que gosta. Todos gostam. O que não pode é parecer que gosta tanto. Pode arrumar outro assunto para esta ligação!

- Tá. Deixa eu pensar.

Passamos dois minutos sem uma palavra. Eu estava distraído, prestando atenção na televisão. Obina, não. Era possível perceber que ele pensava em um segundo assunto para esta ligação.

- Já sei! Liguei para perguntar se você deixou um acarajé para mim ou comeu todos!

- Comi todos, brou. Não sabia que você queria.

- Ah... Então era isso! Abraço!

- Outro.

Desligamos. Ele, eu não sei. Mas eu comi o último acarajé do pote.