quarta-feira, 17 de junho de 2009

Entrevista com George Harrison


No dia de hoje acordei com a imensa alegria de um dia de folga. "Ufa!", pensei, "Ainda bem que hoje não terei que entrevistar nenhum Beatle!". Espreguicei-me com todas as forças, tomei meu achocolatado com calma, e li, tim tim por tim tim, todas as notícias do Palmeiras, o time de meu coração. A campainha tocou.

Imóvel, comecei a maldizer o mundo. "Por que alguém vem me procurar num dia de folga?!", pensei. "Por quê, meu Deus? Por quê?"! O sujeito tocou novamente, mas dessa vez disse:

- André, eu sei que você está aí tomando seu café da manhã!

Era uma voz conhecida. Uma voz que já tinha atingido meus ouvidos em alguns discos dos anos 60. Uma voz inglesa, uma voz defunta! Cacilda, era George Harrison vindo me visitar!

Não havia outra coisa a fazer, senão abrir a porta. Havia me esquecido que hoje era dia de entrevistar o Harrison. Já não gosto de entrevistar pessoas importantes. Entrevistar defuntos importantes é coisa pior ainda! Se eu não fizer alguma pergunta importante, sei que milhões de beatlemaníacos reclamarão. Se eu for um pouco rude, outros também farão comentários mal humorados neste espaço.

- Olá, André!

- Olá, George! Desculpe. Acho que esqueci a geladeira aberta. E deve ter alguma panela de feijão aberta há mais de sete dias. Meu Deus, que cheiro horrível!

O cheiro era de George.

Depois de alguns anos apodrecendo em um caixão, algumas pessoas vão adquirindo um cheiro não muito agradável. Desculpe a insistência, mas lembra muito feijão esquecido na geladeira.

Parece que ele não estava com muita vontade de dar entrevistas:

- Como é que é? Não se respeita mais os mortos? Além de lidar com vermes, agora temos que nos relacionar com repórteres?

- Eu não o obriguei a dar entrevista. Aliás, nem tinha muita vontade de entrevistá-lo. Estou ansioso é para entrevistar Paul. Ele é muito cabeçudo.

- Se não foi você, então quem foi?

- Deve ter sido Deus. Dizem que ele ficou com muita vontade de ver como você se sairia depois de ver a do John Lennon. Ele adorou a do John!

- Hum... Compreendo.

Ele olhou a minha geladeira e deu outro sorriso. Foi até ela e a abriu prontamente.

- Coca-Cola! Eu quero, eu quero!

- Pode pegar.

Ele tomou os dois litros direto da garrafa, numa golada única. Antes que fosse possível arrotar, olhou-me pedindo outra.

- Só tem quente.

- Pode ser, pode ser!

Fui buscar na área de serviços e, pombas, não tinha!

- George, não tem!

Ele me olhou bravo, raivoso, puto como um super star que não teve seu desejo atendido.

- Mas eu posso lhe fazer uma limonada suíça divina! Quer?

- Não! Eu quero Coca! Não quero suco. Coca! É Coca que eu quero.

- Coca não tem. E você ainda tem que dar a entrevista.

O tédio era evidente. Não se sabe como o encontro de uma pessoa tão genial como eu com uma pessoa tão famosa e criativa como George poderia cair nesse tédio todo. Ele começou a cantarolar Ana Julia.

- O que é aquele martelo com aquele prego ali?

- Sei lá. Deixei ali sem querer.

Enquanto eu estava sentado, ele não teve dúvida. Martelou os pregos na minha cabeça.

Com uma imensa dor de cabeça, levantei bruscamente, e ele quase furou meu olho com um dos pregos!

- Vamos logo à entrevista, que você está me irritando!

- Ok, ok.

Eu: Como é morrer depois de ter feito tanto sucesso?

George Harrison: Morrer não tem segredo. É como dormir, só que pra sempre. Aliás, é como dormir com mosquitos pela noite inteira. Só que no lugar dos mosquitos, tem vermes.

Eu: Se você pudesse escolher entre morrer e estar vivo, o que preferiria?

George Harrison: Estar vivo, com certeza. Na vida, tem Coca-Cola. Aliás, está me dando uma vontade absurda de fazer cocô.

George correu para o banheiro sem que eu lhe dissesse onde ficava. Engraçado, que a necessidade fecal nos porta de uma bússola instintiva - em que o norte é o banheiro. Fiquei ao lado da porta, primeiro para saber como é que um Beatle defecava. Depois, para saber como um morto fazia cocô!

Posso dizer que o cheiro é o mesmo. Se não o mesmo, um pouco mais adocicado. A cada pum que ele soltava, o cheiro melhorava. Parece que os mortos realmente tôm dentro a melhor parte.

Ele não deu descarga e saiu sem lavar as mãos, o que me pegou inteiramente de surpresa. Fiquei um pouco preocupado ao pensar se ele usou ou não papel higiênico.

Sei que isso não pode ser de seu interesse. Sei que o que um Beatle pensa é importante porque isso só ocorre com um beatle, e que cocô dele não é importante porque todo mundo faz. Se não quiser saber mais sobre o tema, faça o favor de pular algumas linhas.

Acontece que olhei a privada algumas horas depois e não havia nada lá, a não ser uma marca de cocô no fundo da privada, que pode ter sido provocada por qualquer outra pessoa. Eu não a fiz, porque isso nunca me aconteceu, mas eu não moro sozinho, e não posso responder pelas outras pessoas da minha casa.

Eu: Como é fazer cocô depois de tantos anos?

George Harrison: É tão bom quanto tomar Coca depois de tantos anos, como arrotar, soltar pum e suar depois de tantos anos. Me diga com sinceridade. Eu estou fedendo?

Eu: Está, sim.

George Harrison: Era exatamente o que eu desconfiava. Você se importaria se eu fosse embora agora?

Eu: Nem um pouco. Sexta-feira a gente se vê no encontro com os outros Beatles.

George Harrison: Ok. Até lá!

Um comentário:

Anônimo disse...

Grande entrevista. É gratificante saber que George continua fazendo jus ao Beatle que sempre foi ao lado dos grandes John e Paul: uma merda que some no fundo privada ofuscado pela merda maior que Ringo era.

Parabéns pela entrevista!
Espero que role uma canjinha musical no reencontro.